segunda-feira, 10 de outubro de 2011

A primeira viagem de trem



De cima para baixo: Eu, Eliabe (Brasil) e Wilman (Colômbia)



A noite na estação central de Mumbai estava caótica: pessoas deitadas no chão, crianças gritando e correndo, vendedores ambulantes oferecendo pipoca e “chai”, passageiros validando seus bilhetes, turistas tentando entender as placas em hindi, pedintes sentados nas escadas. Eu estava fascinada por aquele excesso de informação, mas não tinha tempo suficiente para absorver cada detalhe. Meu trem sairia em 15 minutos e eu ainda nem havia encontrado a plataforma que ele partiria.

Estava com mais três amigos brasileiros. No trem nos reuniríamos ao restante do grupo: cerca de 25 trainees, cada um de uma parte do mundo. Passaríamos nossos próximos quatro dias desfrutando das famosas praias de Goa. O destino, justamente por suas paisagens paradisíacas, tornou-se refúgio dos indianos (e estrangeiros) que buscam um lugar mais limpo e relaxante. Estávamos ansiosos por fugir do tumulto de Mumbai.

Encontrada a plataforma, o próximo desafio era identificar qual dos vagões deveríamos entrar. Cada um correspondia a uma determinada classe. Quando fomos comprar as passagens havia disponibiliade em três compartimentos: primeira classe, sleeper e o popular “newspaper”(rs). Este último é conhecido por “jornal” (tradução de newspaper), pois como não há lugar para sentar, você compra seu jornalzinho e se joga (literalmente) no chão rs. Confesso que não estava na vibe de economizar tanto assim. Além disso achei que seria um pouco traumático, logo na minha primeira viagem pela Índia ser tão desprendida rs. Resolvi ir de sleeper.

A diferença de preço entre a primeira classe para a sleeper era de 700,00 rupias. Quis economizar. O motivo do preço ser tão distinto? Na que havíamos comprado, não havia ar condicionado.

Fazia 38C. O vagão estava insuportavelmente quente. A ansiedade e o arrependimento tomavam conta de mim. Não conseguia imaginar como seriam minhas próximas doze horas dentro de um trem, sem ar condicionado, naquele calor. Os corredores cheiravam a suor. Mas não reclamei. Todos estavam sentindo o mesmo e tudo o que menos precisavam era que alguém ficasse colocando defeito em tudo.

O trem começou a andar, o vento a entrar pela janela e em poucos instantes me refresquei. Afinal, não seria tão ruim como eu imaginava. Fiquei aliviada. Aliás, algo muito valioso que eu aprendi ao longo dos meus mochilões foi, justamente, trabalhar expectativa: quanto menor ela for, melhor a sua experiência será. Me preparo sempre para o pior (não, não me considero pessimista), porque tudo de bom que acontecer ao longo do caminho me surpreenderá. As pessoas se frustram muito por sempre esperarem demais. Dica da semana: não espere muito de nada e nem de ninguém, dê o seu melhor e o que vier é lucro ;).

O vento me impedia de sentir o cheiro forte, me fazia esquecer de quão quente estava lá fora e o papo estava tão interessante que não via mais as horas passarem. Cada trainee falava de seu país, dos seus motivos pra terem vindo à Índia, das diferenças culturais e é engraçado, pois como sempre, o papo acabou no “aprender palavrões em outros idiomas” rs.

Depois de tantas risadas o sono apareceu. Fui surpreendida, mais uma vez, quando descobri que cada um teria a sua “cama” (fazia sentido o nome da classe ser “sleeper”, em uma traução bem literal, algo como “dorminhoco”). Havia um banco acima das nossas cabeças (até então achei que era o lugar para colocar as malas como, geralmente, vemos nos ônibus), o encosto que nossas costas estavam apoiadas era a segunda “cama”que precisava apenas ser montada e o local aonde estávamos sentados era a terceira.

A ala masculina sugeriu que eu pegasse a de cima. Afinal era mais fresquinho por ser próximo do ventilador (que cavalheiros, não? Gosto assim!) e a chance de algum indiano “desentendido” passar a mãozinha era quase nula. Topei e subi a escada. Pude alugar até travesseiro e lençol de um vendedor que passou pela nossa cabine. Relaxei, dormi e acordei já em Goa.

Quando desembarcamos, pegamos o taxi e começamos a desbravar as ruas, entendi imediatamente porque o lugar era tão famoso. Mas aí já é outra história...

Nenhum comentário:

Postar um comentário