Ontem fez 1 mês que eu cheguei em terras indianas. Em tão pouco tempo aconteceu tanta coisa que as vezes tenho a impressão de estar aqui a mais semanas. O mais engraçado é que o tempo vai passando e você começa a se acostumar a situações que antes te chocavam. Explico:
Chegou uma brasileira nova em Mumbai. Estávamos indo a um restaurante localizado em Bandra, ao sul da cidade. Estávamos no taxi: eu, ela e mais duas trainees do Brasil. O carro parou no semáforo. Estava curtindo(!) uma musica indiana que tocava na rádio e olhando a paisagem quando escuto um “Aaaaaaaaahhhhhhhhhhhhhhh, um rato”.
Com apenas uma semana de Índia era a primeira vez que a novata via um desses malditos animaizinhos. O que mais me assustou não foi o roedor, mas sim a minha reação e a das meninas que já estão aqui a mais tempo: nós rimos! E rimos ironizando: “Nossa, que grande novidade, um rato”!
Logo depois de fazer isso, eu me lembrei de que fizeram o mesmo quando eu vi um rato pela primeira vez na Índia. Ele era enorme! Veio correndo na minha direção e eu gritei desesperada. Todos tiraram sarro de mim. Eu não entendi na época (Observação: época = isso faz 4 semanas). Como poderia ser normal ver um ratinho correndo feliz do seu lado e não se assustar. Não sei se é normal, mas hoje isso é muito comum pra mim.
Assim como tornou-se comum: ver crianças e adultos defecando em público. Encontrar vaca, galinha, cabra, bode, elefante, barata, caminhando nas ruas (já falei dos ratos?). Quase ser atropelada diariamente pelos rikshaws, ciclistas, motoqueiros, pedestres e animais. Ter que barganhar em tudo para pagar um preço “justo”. Ficar surda com as infinitas buzinas e ainda ter que ler nas placas dos meios de transporte “horn ok please” (buzine por favor). Morar em um flat com mais 6 pessoas (cada um de uma parte do mundo) e como não tem lugar suficiente para todos, ter que dormir na sala. Comer curry no café da manhã, almoço e jantar. Fazer academia e seu personal indiano te corrigir em hindi, mesmo você não sabendo esta língua. Ficar estressada no trabalho e poder descer para o refeitório da empresa para jogar sinuca ou tênis de mesa. Não precisar usar roupa social no escritório e poder ficar descalça. Ser elogiada por ainda usar perfume e por se maquear (Mãe, lembra que eu te prometi que não perderia a vaidade? Então. rs). A cada dia receber uma proposta nova de emprego extra: seja para dublar um comercial ou fazer ponta em um filme de Bollywood. As crianças da minha rua correrem atrás de mim só pra me darem “bom dia” pelo nome. Não comer carne de vaca. Torcer para que o sábado chegue logo só para poder comer atum no “Subway do dia”. As pessoas te pararem na rua só para perguntarem se podem passar a mão no seu cabelo. Comer em lugares que antes você achava que não tinham higiene (agora eles têm?). A cada dia planejar uma viagem para um país diferente e seu chefe ser super flexível com suas folgas. Todo dia ser surpreendida.
Eu só sei que já não sei mais o que é normal, loucura, certo ou errado. Acredito que tudo depende do ponto de vista. Tento apenas manter meus valores, não julgar a cultura alheia e aprender com as diferenças. Quer saber? “Só sei que nada sei” MESMO. Mas eu desconfio de várias coisas...
segunda-feira, 24 de outubro de 2011
segunda-feira, 17 de outubro de 2011
Trabalhando numa premiére de Bollywood
“Você quer trabalhar em um evento?” foi o que eu li quando abri meu facebook semana passada. Uma amiga colombiana, que eu conheci na Índia, havia me escrito a mensagem via “inbox”. Ela tinha o contato de uma agente espanhola que recrutava estrangeiras e haveria um evento na qual eu tinha “chances” de ser contratada. Sem saber muito bem do que se tratava, conforme recomendado, mandei um e-mail pra tal agente com duas fotos minhas anexas. Detalhe: fotos que destacassem que eu sou alta e “loira”. Não, nos padrões brasileiros eu não sou loira, mas nos indianos sim rs. O convite me fez lembrar do conselho que recebi logo que cheguei em Mumbai:
Quando desembarquei no aeroporto fui recepcionada por uma comitiva de trainees latinos. Uma das brasileiras presentes me alertou assim que me conheceu “pinte seu cabelo de loiro e você vai ganhar muito dinheiro aqui”. Não entendi muito bem. Apenas respondi que as luzes californianas (tecla sap para os homens: as luzes são feitas só nas pontas do cabelo para dar um certo brilho rs) eram o máximo que combinava comigo.
Mal enviei a mensagem e meu celular tocou. Saí do meu devaneio. Era a tal produtora querendo ter certeza de que eu estaria livre no dia seguinte. Disse que poderia comparecer depois do meu trabalho. Combinamos de nos encontrar em um shopping ao sul da cidade. Pedi mais informações sobre o evento. Ela apenas disse que me explicaria melhor pessoalmente. Só topei, porque o dinheiro pago por 5 horas de trabalho seria suficiente pra pagar minhas contas fixas do próximo mês inteiro. Como planejo viajar muito pela Ásia, uma grana extra seria muito bem-vinda.
Cheguei ao local combinado. Liguei para meu contato e em poucos minutos lá estava eu em um camarim (!) sendo maqueada por profissionais.
Fiquei deslumbrada com a quantidade de maqueadores e cabelereiros que haviam no local. Sentei em uma poltrona e começaram a transformação: prenderam meu cabelo a la “rabo de cavalo”, minha pálpebras receberam uma sombra escura, minhas bochechas se bronzearam e meus lábios ficaram vermelhos. Coloquei uma calça e uma regata preta, um cinto com um revólver (!) de brinquedo e somente dez minutos antes do show começar, finalmente, me explicaram minha responsabiliade naquela noite: receber os VIPs da premiére do filme Azaan, um filme de ação Bollywoodiano. Havia cerca de vinte e cinco estrangeiras contratadas e cada uma tinha a sua própria função. Todas estavam, assim como eu, vestidas de policial.
Eu não fazia a menor ideia de quem era famoso na Índia ou de quem só estava no cinema para ver a estreia. Todos estavam tão bem vestidos que eu me perguntava como saberia diferenciá-los. Mas não poderia deixar que percebessem minha aflição, mesmo não conseguindo ao menos identificar os atores que trabalharam no filme.
Fui para o meu posto. O salto alto e o batom vermelho me davam um pouco mais de auto-confiança. Quando entrei na sala de cinema, nenhum telespectador ou celebridade havia chegado. Estavam presentes apenas quatro meninos responsáveis pela limpeza. Eram a minha salvação.
Me aproximei e para a minha sorte um deles falava um pouco de inglês. Foi o suficiente para ele entender meu pedido.
Combinamos que ele limparia próximo ao lugar que eu ficasse. Desta forma, ele poderia me dar sinais se a pessoa era ou não famosa. Seria uma honra pra ele poder ficar tão perto dos artistas que ele via na televisão. Para mim, aquilo tudo era uma experiência maluca que me renderia muitas risadas, uma boa história e algum dinheiro no bolso.
Os convidados entraram, os recepcionei com um sorriso e meu plano funcionou perfeitamente. No final da noite voltei pra casa ainda não acreditando na noite que havia tido. Mas abri meu e-mail e já estava com outra proposta de trabalho ainda mais exótica...
segunda-feira, 10 de outubro de 2011
A primeira viagem de trem
A noite na estação central de Mumbai estava caótica: pessoas deitadas no chão, crianças gritando e correndo, vendedores ambulantes oferecendo pipoca e “chai”, passageiros validando seus bilhetes, turistas tentando entender as placas em hindi, pedintes sentados nas escadas. Eu estava fascinada por aquele excesso de informação, mas não tinha tempo suficiente para absorver cada detalhe. Meu trem sairia em 15 minutos e eu ainda nem havia encontrado a plataforma que ele partiria.
Estava com mais três amigos brasileiros. No trem nos reuniríamos ao restante do grupo: cerca de 25 trainees, cada um de uma parte do mundo. Passaríamos nossos próximos quatro dias desfrutando das famosas praias de Goa. O destino, justamente por suas paisagens paradisíacas, tornou-se refúgio dos indianos (e estrangeiros) que buscam um lugar mais limpo e relaxante. Estávamos ansiosos por fugir do tumulto de Mumbai.
Encontrada a plataforma, o próximo desafio era identificar qual dos vagões deveríamos entrar. Cada um correspondia a uma determinada classe. Quando fomos comprar as passagens havia disponibiliade em três compartimentos: primeira classe, sleeper e o popular “newspaper”(rs). Este último é conhecido por “jornal” (tradução de newspaper), pois como não há lugar para sentar, você compra seu jornalzinho e se joga (literalmente) no chão rs. Confesso que não estava na vibe de economizar tanto assim. Além disso achei que seria um pouco traumático, logo na minha primeira viagem pela Índia ser tão desprendida rs. Resolvi ir de sleeper.
A diferença de preço entre a primeira classe para a sleeper era de 700,00 rupias. Quis economizar. O motivo do preço ser tão distinto? Na que havíamos comprado, não havia ar condicionado.
Fazia 38C. O vagão estava insuportavelmente quente. A ansiedade e o arrependimento tomavam conta de mim. Não conseguia imaginar como seriam minhas próximas doze horas dentro de um trem, sem ar condicionado, naquele calor. Os corredores cheiravam a suor. Mas não reclamei. Todos estavam sentindo o mesmo e tudo o que menos precisavam era que alguém ficasse colocando defeito em tudo.
O trem começou a andar, o vento a entrar pela janela e em poucos instantes me refresquei. Afinal, não seria tão ruim como eu imaginava. Fiquei aliviada. Aliás, algo muito valioso que eu aprendi ao longo dos meus mochilões foi, justamente, trabalhar expectativa: quanto menor ela for, melhor a sua experiência será. Me preparo sempre para o pior (não, não me considero pessimista), porque tudo de bom que acontecer ao longo do caminho me surpreenderá. As pessoas se frustram muito por sempre esperarem demais. Dica da semana: não espere muito de nada e nem de ninguém, dê o seu melhor e o que vier é lucro ;).
O vento me impedia de sentir o cheiro forte, me fazia esquecer de quão quente estava lá fora e o papo estava tão interessante que não via mais as horas passarem. Cada trainee falava de seu país, dos seus motivos pra terem vindo à Índia, das diferenças culturais e é engraçado, pois como sempre, o papo acabou no “aprender palavrões em outros idiomas” rs.
Depois de tantas risadas o sono apareceu. Fui surpreendida, mais uma vez, quando descobri que cada um teria a sua “cama” (fazia sentido o nome da classe ser “sleeper”, em uma traução bem literal, algo como “dorminhoco”). Havia um banco acima das nossas cabeças (até então achei que era o lugar para colocar as malas como, geralmente, vemos nos ônibus), o encosto que nossas costas estavam apoiadas era a segunda “cama”que precisava apenas ser montada e o local aonde estávamos sentados era a terceira.
A ala masculina sugeriu que eu pegasse a de cima. Afinal era mais fresquinho por ser próximo do ventilador (que cavalheiros, não? Gosto assim!) e a chance de algum indiano “desentendido” passar a mãozinha era quase nula. Topei e subi a escada. Pude alugar até travesseiro e lençol de um vendedor que passou pela nossa cabine. Relaxei, dormi e acordei já em Goa.
Quando desembarcamos, pegamos o taxi e começamos a desbravar as ruas, entendi imediatamente porque o lugar era tão famoso. Mas aí já é outra história...
segunda-feira, 3 de outubro de 2011
Abrindo a mente para entender a Índia
Fazia quatro horas que o avião da cia aérea South African havia partido de Joanesburgo com destino a Mumbai. Eu não conseguia dormir. Estava sentada próxima da janela e meu olhar oscilava entre o céu estrelado e a série “Lie to me”. A verdade é que eu não prestava atenção em nenhum dos dois. Minha mente estava no Brasil e em tudo que eu havia renunciado para passar meus próximos meses na Índia: abandonei meu emprego, tranquei meu curso de jornalismo, me despedi dos meus amigos e mais uma vez ficaria longe da minha família. E tudo por quê? Era o que eu tentava me lembrar naquele instante nostálgico...
O voo estava repleto de mulheres. Como elas eram diferentes. Provavelmente, elas pensavam o mesmo de mim. Algumas vestiam seus saris e piercings no nariz, outras preferiam jeans e bata. Ambas tinham um olhar sereno e curioso. E independente da roupa escolhida, todas estavam acompanhadas por seus homens. Elas me olhavam e comentavam qualquer coisa aos seus companheiros em uma língua que eu não compreendia. Era óbvio pra eles que eu não era indiana
As comissarias perguntavam “Veg food or non veg food?” (Comida vegetariana ou não vegetariana) e a maior parte dos passageiros optava pela primeira. Eu não. Comi arroz e frango ao molho curry. Não sabia qual a próxima vez que comeria “carne”. Antes de fazer meu pedido, porém, as refeições acabaram. A comissária pediu licença e foi até a cozinha repor os recipientes para terminar de servir os viajantes.
A senhora ao meu lado havia feito sua escolha: lasanha vegetariana. Antes de dar a primeira garfada, no entanto, sorriu e me perguntou “Do you want my food, my friend?” (Você quer minha comida, minha amiga?) Eu, ainda impressionada com a gentileza, apenas recusei, agradeci e retribui o sorriso.
Atitudes assim não são exceções na Índia. Há varios que tentam tirar vantagem, como em qualquer lugar. Mas há muitos que se mostram solícitos. Seja para dar uma informação na rua, pra te contar alguma história hindu ou perguntar seu nome para te saudar todas as manhãs.
Sim, os ratos ainda me assustam. Mas percebi que estes mesmos animais que me matam de medo são os únicos “brinquedos” que algumas crianças têm. O nojo que eu tinha de ver pessoas defecando na rua, me impedia de enxergar que elas não fazem isso apenas por não terem higine, mas se sujeitam, principalmente, por não terem um lugar decente pra morar.
É mesquinho ter ânsia de um lugar sujo, mas que eu estou por opção e não por obrigação. E os indianos que não tiveram este direito de escolha? Será que escolheriam que seus filhos brincassem ao lado de ratos, corvos e baratas?
Parece que, finalmente, eu comecei, mais do que abrir a mente, a abrir meu coração para aprender, aproveitar e me apaixonar pela Índia...
O voo estava repleto de mulheres. Como elas eram diferentes. Provavelmente, elas pensavam o mesmo de mim. Algumas vestiam seus saris e piercings no nariz, outras preferiam jeans e bata. Ambas tinham um olhar sereno e curioso. E independente da roupa escolhida, todas estavam acompanhadas por seus homens. Elas me olhavam e comentavam qualquer coisa aos seus companheiros em uma língua que eu não compreendia. Era óbvio pra eles que eu não era indiana
As comissarias perguntavam “Veg food or non veg food?” (Comida vegetariana ou não vegetariana) e a maior parte dos passageiros optava pela primeira. Eu não. Comi arroz e frango ao molho curry. Não sabia qual a próxima vez que comeria “carne”. Antes de fazer meu pedido, porém, as refeições acabaram. A comissária pediu licença e foi até a cozinha repor os recipientes para terminar de servir os viajantes.
A senhora ao meu lado havia feito sua escolha: lasanha vegetariana. Antes de dar a primeira garfada, no entanto, sorriu e me perguntou “Do you want my food, my friend?” (Você quer minha comida, minha amiga?) Eu, ainda impressionada com a gentileza, apenas recusei, agradeci e retribui o sorriso.
Atitudes assim não são exceções na Índia. Há varios que tentam tirar vantagem, como em qualquer lugar. Mas há muitos que se mostram solícitos. Seja para dar uma informação na rua, pra te contar alguma história hindu ou perguntar seu nome para te saudar todas as manhãs.
Sim, os ratos ainda me assustam. Mas percebi que estes mesmos animais que me matam de medo são os únicos “brinquedos” que algumas crianças têm. O nojo que eu tinha de ver pessoas defecando na rua, me impedia de enxergar que elas não fazem isso apenas por não terem higine, mas se sujeitam, principalmente, por não terem um lugar decente pra morar.
É mesquinho ter ânsia de um lugar sujo, mas que eu estou por opção e não por obrigação. E os indianos que não tiveram este direito de escolha? Será que escolheriam que seus filhos brincassem ao lado de ratos, corvos e baratas?
Parece que, finalmente, eu comecei, mais do que abrir a mente, a abrir meu coração para aprender, aproveitar e me apaixonar pela Índia...
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